domingo, 28 de outubro de 2012

Valorizemos o professor da educação infantil


País - Sociedade Aberta


Jornal do Brasil PUBLICIDADE

Essa ideia do senso comum tem raízes históricas e ignora os saberes científicos sobre a importância fundamental que os primeiros anos de vida têm para a formação de cada um de nós e para a sociedade como um todo. Cuidar da educação de crianças em creches e pré-escolas pressupõe conhecer os processos de desenvolvimento infantil, as linguagens que estimulam esse desenvolvimento e a organização de espaços e atividades, além do desafio de dar atenção tanto a cada uma quanto ao conjunto das crianças. Trocando em miúdos, para ser professor na educação infantil, como nos demais níveis e modalidades de ensino, é preciso estudar muito, pois a tarefa é complexa e de muita responsabilidade.
Acontece que ainda temos muito a fazer pela qualificação da formação desses profissionais. Segundo o Censo Escolar de 2011, 61% dos professores de educação infantil têm ensino superior completo. Outros 29% fizeram o curso de magistério, e 8% possuem apenas o ensino médio regular. E ainda existem 0,35% e 0,74% que possuem apenas o ensino fundamental incompleto e o fundamental completo, respectivamente.
Incentivar os quase 40% sem curso superior a entrar em uma faculdade é garantir que creches e pré-escolas tenham pessoas com a qualificação mínima almejada para a educação pública, de forma que o professor esteja preparado para lidar com as diferenças e dificuldades típicas da primeira infância. No entanto, para começar a mudar o cenário de forma mais profunda, é preciso dar apoio e estabilidade ao professor. A presença de coordenadores pedagógicos, responsáveis pelo acompanhamento e suporte aos professores em serviço, nem sempre está assegurada nas redes municipais de ensino. Outro ponto crucial é a estabilidade funcional. Sem ela, vive-se um eterno recomeço no trabalho de formação. Esse problema é sentido em um dos projetos desenvolvidos pelo Instituto C&A, o Paralapracá, que apoia a formação de professores de educação infantil em cidades da Região Nordeste.
Muitos dos professores que começam a formação estão vinculados às redes por contratos temporários ou são estagiários, nem sempre permanecem na função e, consequentemente, não completam a formação. Se não houver concursos bem estruturados e um plano de carreira que incentive a permanência dos professores na rede e na escola em que lecionam, continuaremos a carregar água na peneira, investindo na formação de quadros que mudam com muita frequência, o que impossibilita um trabalho continuado e coletivo, como requer a docência.
A estabilidade pressupõe outras questões envolvidas na valorização profissional, como remuneração adequada à função exercida. Hoje, um profissional com curso de magistério tem piso salarial de R$ 1.451,00 para trabalhar 40 horas semanais. O valor é bem abaixo da média recebida pelos profissionais de nível técnico no Brasil, que é de R$ 2.085,47. É urgente dignificar o salário do professor de educação infantil, pois ele é o primeiro contato da criança pequena com a educação formal. É ele quem apresenta o universo escolar para os alunos. Ele é o responsável pela socialização dessa faixa etária. É ele que será a referência para as famílias, e sua atuação repercutirá nos processos de aprendizagem das crianças por muito tempo.
Garantir atendimento de qualidade na primeira infância é a efetivação de um direito social básico previsto na Constituição federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Mas como garantir esse direito e cumprir as metas de educação infantil citadas no PNE? Para isso, é preciso que a sociedade brasileira reconheça a importância da educação para as crianças pequenas e apoie a luta pela valorização dos profissionais encarregados dessa educação.

* Patrícia Lacerda, doutora em educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, é gerente de Educação, Arte e Cultura do Instituto C&A.

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